quinta-feira, 14 de novembro de 2013

23. O dilema de uma mãe



A Florida sente-se mais sozinha do que jamais se sentiu. Agora seria óptima ideia se ela também tivesse uma mãe para perguntar: ó, mãe, o que é que devo fazer para salvar o meu filho? Mas, como já dissemos no início da nossa história, a Florida pertence àquelas pessoas pouco sortudas, que desde muito cedo têm de caminhar na vida com os seus próprios pés, sem apoio de ninguém.
As paredes calam-se. A janela não sente a sua dor. Os livros que estão na mesa não sabem dizer-lhe nada.
Quanto difícil é decidir! A coisa correcta seria sem dúvida chamar a Polícia. Mas, por outro lado, aquele homem disse que se ela chamasse a Polícia, iam matar o seu filho! Meu Deus, não deixes que me matem o meu Joãozinho, pensa.
De repente se lembra das exigências dos raptores. Onde vai encontrar o dinheiro que lhe pediram? Nem sequer ter poupanças. Tudo o que ganha do seu trabalho no café não basta para ter uma vida decente, muito menos para poupar. Aliás, as pessoas que conhece são também gente pobre. Mas, mesmo se não fossem pobres, quem lhe emprestaria dinheiro?
Ninguém, esta é a resposta certa. Ninguém lhe prestaria dinheiro. A Florida inocente já cresceu, não acredita nas fábulas e sabe perfeitamente de onde vêm os bebés. Sabe também que a sociedade é muito cruel, especialmente para com os pobres. Não há bondade no mundo, não senhor, e também não há justiça, porque se houvesse justiça, ela, que não tem nada mais do que o seu filho, não estaria nesta situação tão difícil e tão triste.
O que vai acontecer, então? Porque, se não encontrar o dinheiro que os raptores querem... é muito provável... é muito provável que... (não quer nem sequer pensar nisto) ... que ... (que o matem, porquê não o diz?)....
Não tem tempo. Os segundos voam, os minutos correm, as horas passam rapidamente. Muito pronto serão as seis... e depois as sete... e depois...
Soa o telefone. Mecanicamente, a Florida levanta o auscultador.
- Boa tarde, senhora Pestana, ouve-se uma voz que lhe parece conhecida. Como está?
- Bem, responde ela, simplesmente por costume. Quem é?
- Desculpe, claro, não me presentei. Sou o comissário Santos.
- Alguma novedade, comissário? pergunta a Florida, pensando que pudesse ter acontecido algum milagre.
- Não, sinto muito, não tenho nenhuma novedade. Sabemos, claro, os nomes das pessoas que raptaram o seu filho...
- Sabem? Quem são?
- Sinto muito, mas são pessoas com um passado criminal. Um deles chama-se Manuel Matias e no passado foi condenado por contrabando, e o outro chama-se Elias Carvalho e é um ladrão de carros, que foi preso pelo menos duas vezes.
- Isto é boa notícia, não é? pergunta a Florida. Porque, se os senhores conhecem quem são, é mais fácil encontrá-los.
- Pois, o problema é que não podemos encontrá-los, pelo menos ainda. Não sabemos onde estão. Mas não se preocupe, espero muito pronto estar na posição agradável de poder devolver o seu filho à si.
A Florida está indecisa. Se avisar a Polícia, matam o Joãozinho, pensa. Se não encontrar o dinheiro pedido, também o matam. Falo ou não falo?
- Senhora, está bem? ouve-se a voz do comissário Santos. Aconteceu-lhe alguma coisa?
- Não, não aconteceu nada, estou bem, obrigada.
- Não queria incomodar a senhora, mas telefonei para lhe dar os meus desejos para o Natal. Oxalá o ano novo, que está a aproximar, a encontre com o seu filho nos braços. Eu, por minha parte, vou fazer tudo o que puder.
- Muito obrigada. Que Deus oiça.
- A minha esposa também lhe manda os seus melhores desejos. Reza por si e pelo seu filho todos os dias.
- Diga-lhe que lhe agradeço a bondade.
- Estive a pensar, diz o comissário, que é muito provável, já que o seu filho não foi raptado pelo bando brasileiro, que a senhora receba algum telefonema dos raptores.
Os cabelos da Florida movem-se no seu crânio.
- Se, continua o comissário, se os raptores vierem em contacto consigo, por favor avise-me.
Se avisar a Polícia, pensa a Florida, matam-no.

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