quinta-feira, 3 de outubro de 2013

6. Assustado



Longe da sua casa, o Joãozinho acordou assustado. Que trovões, meu Deus! Onde estava a sua mãezinha querida? Começou a chamá-la, várias vezes. Então, ouviu-se um trovão e a porta do quarto abriu.
- Não te disse para ficares tranquilo? disse o Maestro. Porque gritas? Não sabes que quando chove há trovões? Pára com os gritos, ou não acabas bem, aseguro-to. Percebes, ou estou a falar para o boneco?
- É apenas uma criança, disse o Passarinho que entrou também no quarto. As crianças têm medo dos trovões. O meu Tomás...
- Pára tu também com o teu Tomás! Preciso de dormir e se este miudo não me deixar dormir, não vou poder trabalhar amanhã! Preciso de ter a cabeça clara, para conseguir encontrar um cliente que valha.
O Passarinho olhou para o Joãozinho. Ele continuava a chorar, mas muito baixo, como se estava a murmurar. O seu Tomás também tinha medo dos trovões. Sentiu compaixão pelo menino.
- Anda tu, disse ao Maestro, e eu fico com o miudo. Não vai gritar mais. Anda!
- Tu não és homem, disse o Maestro enquanto saía do quarto. Vou fechar à chave.
Fechou a porta.
- O que é isto, menino? perguntou o Passarinho. Não sabes que não deves ter medo dos trovões?
O Joãozinho olhou para ele. Sabia a história do tambor do céu?
- A minha mãe diz que os trovões são o tambor do céu, disse a voz baixa.
- É? disse o Passarinho e bocejou levemente. Pois, a minha mãe dizia que quando chove é porque Deus está a chorar pelos nossos pecados.
- Que significa «pecado»? perguntou o menino.
- Más acções, disse o homem e ficou pensativo. Bocejou outra vez. Enfim, não é hora para falar sobre tambores e pecados. Mexe-te, vai mais perto da parede, vamos dormir juntos.
O homem gordo deitou-se na cama e abraçou o menino para os dois caberem melhor.
- Vamos dormir, repetiu.
O Joãozinho fechou os olhos. O corpo do Passarinho era quente e fofo. O Passarinho fechou os olhos também. O corpinho do Joãozinho era muito magro, como uma marioneta de madeira. O seu Tomás era muito magro também.
Na cama, os dois corpos abraçados estão a dormir. Os dois parecem ser muito bem-amados entre si, exactamente como são bem-amados entre si um pai ou uma mãe e o seu filho. Porque, se pudéssemos entrar no coração de cada um, veríamos que o Joãozinho está com a Florida e que o Passarinho está com o seu pequeno Tomás.
Numa casa pequena, não muito longe do lugar onde está o nosso amigo, o senhor Pedro Pinheiro, empregado laborioso de uma empresa têxtil durante vinte e nove anos, volta à sua cama, depois de ter visitado o quarto de banho, por causa do próstata. A Gertrudes, a sua mulher, está acordada também.
- Onde estavas? pergunta.
- Na casa de banho.
- Está a chover ainda?
- Não, ainda não. Foi uma tempestade e já terminou.
- Que horas são?
- As quatro e vinte. Volta a dormir. É cedo ainda.

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